Neste passado fim-de-semana o futebol espanhol foi atingido por uma grande tempestade, e não só no sentido metafórico, começando por criar sérios danos na Galiza na noite da passada quinta-feira. Uma média de 80 litros de água caiu por metro quadrado, 126 litros nas áreas mais atingidas e o vento atingiu uma velocidade de 120km/h.

Esta tempestade causou o desmoronamento de uma fachada de um centro desportivo, danificou uma torre de controlo de um aeroporto, os rios transbordaram, dezenas de árvores foram arrancadas, duas pessoas morreram e registaram-se 640 chamadas para o 112. No total, 49,378 pessoas ficaram sem electricidade e a primeira divisão de futebol ficou sem dois jogos de futebol, que deveria ser o que menos importa no meio disto tudo, mas às vezes parecia que era mesmo o mais importante. Principalmente no que diz respeito ao adiamento do jogo do Real Madrid.

Jogo inaugural da jornada adiado no Riazor

Estádio Riazor também ficou bastante danificado.

Estádio Riazor também ficou bastante danificado.

Foram adiados 48 jogos na Galiza, incluindo o jogo que abria a jornada, na sexta-feira à noite, e o jogo que a fechava, 48 horas depois. Na sexta-feira, o jogo do Deportivo contra o Real Betis foi cancelado depois de algumas partes do telhado do Riazor terem sido arrancadas pelo vento, revestimentos plastificados partidos e pendurados, buracos no telhado e outras partes a caírem. Tino Fernández, presidente do Deportivo, admitiu que era um inconveniente para muita gente, mas que foi decidido colocar a segurança dos jogadores, adeptos e trabalhadores em primeiro lugar. Posto isto, o Deportivo-Real Betis foi então o primeiro jogo, do mais alto escalão de futebol espanhol, a ser adiado desde o Sevilla-Barcelona em Abril de 2006, quando uma espécie de tempestade bíblica tornou o Sánchez Pizjuán numa piscina pública. O primeiro, mas não o último.

À medida que o presidente do Deportivo da Corunha ia olhando para as condições em que se encontrava o Riazor, que é propriedade municipal, afirmava que tem o pior telhado no futebol espanhol. Ora se muitos concordaram com isso naquele dia, um dia depois já discordavam. E se o cancelamento desta partida foi aceite com pouco escândalo, tendo em conta que são forças da natureza, a história viria a ser um pouco diferente uns bons quilómetros abaixo.

Estádio de Balaídos sem condições para recepção a Los Blancos

Telhado do Estádio de Balaídos danificado.

Telhado do Estádio de Balaídos danificado.

Cerca de 160 quilómetros para sul, o vento destruiu o telhado do Estádio de Balaídos do Celta de Vigo que, tal como o Riazor, é propriedade municipal. Ficaram peças espalhadas nas bancadas, no chão de fora do estádio e mesmo no relvado. Ficou ainda um buraco de aproximadamente 20 metros no telhado, com o metal ondulado que constituía o telhado a dobrar e voar, tornado-se perigoso. Foi então feita uma inspecção pelo serviço de bombeiros e oficiais do conselho que deram o estádio como inseguro para albergar um jogo de futebol. Às 13horas de sábado Abel Caballero, presidente da câmara, anunciou que o jogo estava cancelado, enquanto a Liga, a federação de futebol e ambos clubes não anunciaram nada durante horas. A única equipa a dizer alguma coisa publicamente foi o Alavés, que nem sequer ia jogar.

O presidente da câmara disse que o jogo estava cancelado, mas não houve nenhuma confirmação oficial. Em vez disso houve um silêncio rapidamente preenchido por todas aquelas coisas normais: acusações, conspirações, paranóias e as habituais bocas pelos suspeitos do costumo, o normal, portanto. Tudo a agir como se tudo não passasse de um plano em que alguém, nalgum lugar, tivesse feito isto acontecer, ou como se algum indivíduo trouxesse todo este vento e chuva. Aquelas guerras desagradáveis do costume.

O Real Madrid queria jogar, não tinham culpa que o estádio estivesse em más condições e outro jogo adiado iria criar-lhes um grande problema no calendário, já que ficam com dois jogos em atraso, e era uma boa altura para enfrentarem o Celta de Vigo, que tinham uma 2ª mão das meias finais a disputar na quarta-feira à noite, contra o Alavés, e o técnico Eduardo Berizzo já tinha anunciado que iria fazer várias alterações contra os Merengues, focando-se na Taça do Rei. Mesmo em caso de suspeita de que o Celta de Vigo não quereria realizar este jogo, provavelmente por quererem esperar por uma pausa adequada onde pudessem lançar o seu melhor XI sem se terem que preocupar com outras competições, este argumento seria logo deitado abaixo, até porque o Celta de Vigo também tem um calendário bastante preenchido e virou as suas atenções para a 2ª mão da Taça do Rei, significando que pouca diferença faria haver jogo domingo ou não.

A questão agora é: quando é que as duas equipas irão disputar este jogo? Espanha tem um campeonato de 20 equipas e uma Taça de duas mãos. Arranjar um dia para disputar o Deportivo-Real Betis no Riazor é fácil, já que as duas equipas não estão inseridas em mais nenhuma competição, o que também foi uma das razões pela qual não houve grande alarido com o cancelamento da partida, mas arranjar tempo para o Celta-Real Madrid no Balaídos é diferente. O Real Madrid ainda está em duas competições, e o Celta de Vigo em três, pelo que já não há tempo livre a meio da semana daqui para a frente. Se as duas equipas continuarem nas competições europeias a única quarta-feira disponível será dia 15 de Maio, três dias antes do final da época. É preciso arranjar uma solução. Em 2006 atrasaram a temporada uma semana – além do limite imposto pela FIFA – e dividiram o último dia em três partes diferentes, com jogos da última jornada a serem disputadas a 13 de Maio, outros a 16, e os restantes no dia 20. Portanto, agora com dois jogos, é de se esperar uma autêntica confusão.

Isto era algo que o Real Madrid queria evitar. Tal como o Celta de Vigo. No sábado, quando deram o jogo como cancelado, ainda faltava havia um dia e meio para conseguirem arranjar o estádio para a realização da partida, mas não era seguro até que o vento não parasse, o que não estava previsto para tão cedo. Tentaram-se arranjar soluções como: jogar noutro estádio na Galiza, jogar à porta-fechada, ou até mesmo adiar o jogo da Taça. Todas as propostas vinham com dificuldades lógicas, nenhuma era uma boa solução, acabando por nenhuma ser validada.

Balaídos “à beira da ruína”?

Como era de esperar, o cancelamento da partida gerou muitas críticas vindas da capital de Espanha, afirmando que não havia vontade da parte do Celta de Vigo em encontrar uma solução e que o jogo deveria ser jogado na mesma. Outros diziam que quem tinha vontade que o jogo seguisse em frente não estavam a ouvir a razão. Tudo isto levou o presidente da câmara de Vigo a dizer publicamente que seria ridículo colocar a vida das pessoas em risco e que não seria ele a ir para o telhado tentar tapar os buracos. Tudo isto levantou algumas questões pertinentes: o porquê do estádio de Balaídos, como alguns outros em Espanha, estar tão vulnerável, e o porquê de Abel Caballero nunca se ter queixado de segurança antes.

Danos causados pelo vento.

Mais alguns danos causados no telhado do estádio.

O Estádio de Balaídos não é renovado desde o Mundial de 1982. Já em 2012 há um relatório que descreve o Balaídos como “à beira da ruína, e há um ano atrás um adepto do Celta de Vigo foi atingido por um bocado de pedra que se partiu e caiu. Em 2014, houve uma inspecção que recomendou uma renovação total. O trabalho ainda começou mas acabou por ser suspenso. Existe uma diferença, porém, entre um estádio não estar em grandes condições e um estádio que é considerado inseguro, como no sábado. Há uma diferença entre um estádio que foi deixado a desmoronar e um onde o trabalho de renovação ainda não foi concluído. E, acima de tudo, há uma diferença entre um estádio – dois estádios, aliás, em condições normais, e um estádio que enfrenta uma das piores condições climatéricas que alguém se pode recordar, tal como esta tempestade que afectou a Galiza, com o estádio a ser exposto a ventos superiores a 100km/h.

Apesar da decisão de cancelar o jogo ser tomada com antecedência e do presidente da câmara ter anunciado o mesmo, ninguém tornou a notícia oficial até o Alavés se declarar vítima do cancelamento do jogo, alegando que se o Celta fosse ter o fim-de-semana de folga três dias antes da 2ª mão das meias finais, que o seu encontro de quinta-feira também deveria ser adiado, – mesmo embora o Celta fosse descansar a equipa contra o Real de qualquer forma. Ainda assim, no domingo o Alavés apenas actuou com 2 titulares regulares e conseguiu vencer 2-4 em casa do Sporting Gijon.

No meio de tudo isto, e sem notícias quer do Celta de Vigo quer do Real Madrid quanto ao adiamento do jogo, a Liga finalmente pronunciou-se, às 21horas, anunciando que estava a passar os relatórios de segurança à Federação e a cancelar o jogo da noite seguinte. Às 23 horas, já que não conseguiu chegar mais cedo por o seu voo ter sido desviado devido ao mau tempo, o árbitro chegou a Balaídos para inspeccionar o estádio e tomou a decisão final em nome da Federação.

Boas Apostas!