Uma questão de dinheiro, ouve-se um pouco por todo o lado, ao falar-se do título do Paris SG, que a oito jornadas do fim festejou mais um campeonato francês. Pela quarta temporada consecutiva, o investimento feito pelo conjunto de Paris garante o título no seu país, transformando a equipa, cada vez mais, num sério competidor na Liga dos Campeões.
A questão é que não podemos isolar a análise do caso Paris SG no quadro do futebol francês. Ao longo destes últimos anos, não parece que o interesse no futebol gaulês se tenha perdido, nem que a competitividade das restantes equipas a nível interno sofra com o facto de haver, na prática, um vencedor anunciado. Obviamente, uma esperança que, em algumas fases da sua história, levou a termos em França diferentes campeões em anos consecutivos, se voltou a desfazer, lembrando um tanto os anos de glória do Olympique de Lyon. Mas enquanto a conversa se manterá, em França, por mais anos – não se vê, no futuro próximo, nem sintomas de abrandamento do PSG, nem um concorrente que possa investir o mesmo tipo de somas numa das outras equipas, a questão mais larga merece ser olhada.
Competitividade europeia
A razão do investimento desajustado da realidade conjuntural francesa está na necessidade de competitividade europeia. Aplica-se ao Paris SG uma análise que também já foi feita sobre o Bayern de Munique, que tem uma posição dominante no panorama do futebol alemão – nos últimos anos colocada em causa, a espaços, por uma política muito bem definida do Borussia Dortmund que, ainda assim, não evita perder jogadores para o rival -, bem como, em menor escala, ao caso dos grandes em Portugal. Mas também seria bom notar que o mesmo problema poderia ser colocado num campeonato como o espanhol, onde a capacidade do FC Barcelona e do Real Madrid, a espaços acompanhados pelo Atlético de Madrid, estão muito elevadas em relação à maior parte da concorrência.
A Liga dos Campeões fez crescer a distribuição monetária entre as equipas de topo a nível europeu, tornando os conjuntos ricos cada vez mais ricos. Hoje em dia, só mesmo esta competição parece ter o poder de segurar atletas, ainda que não deixe de ser sensível a ideia de que alguns jogadores de equipas ainda em prova – Lavezzi do PSG, Jackson Martínez, do Atlético de Madrid – não tenham hesitado em trocar minutos da Liga dos Campeões pelo milhões da Liga Chinesa.
Poderemos estar a chegar a um ponto em que a transformação do futebol europeu num negócio de muitos milhões, fará com que o futebol europeu perca a guerra dos melhores jogadores. Uma prova que se disputasse apenas a nível europeu – uma Superliga fechada com 12 ou 16 equipas – poderia centrar os melhores jogadores e o dinheiro na elite, mas transformaria também o futebol numa lógica de fechamento tal que tornaria quase impossível vermos jogadores de topo à escala de proximidade que um jogo em Getafe, Ajaccio ou Darmstadt ainda permite.
Uma questão de distribuição
Ao contrário do modelo norte-americano, onde as ligas têm regras muito estritas para garantir o equilíbrio competitivo entre todas as equipas – mesmo que se mantenha, como é natural, a questão de que existem equipas mais ricas ou de mercados poderosos do que outros -, o modelo europeu sempre se baseou numa distribuição que se focava na distribuição ao nível da elite – patrocínios, televisões, prémios – que depois era passada para os outros degraus da escala com as transferências.
No entanto, com o aumento do dinheiro a ser distribuído no topo, os números das transferências acabam afetados por uma crescente especulação, percebendo-se maior número de trocas entre equipas de países e continentes diferentes, bem como com enormes fatias a serem “comidas” pelos intermediários e não pelos clubes formadores. A antiga ideia de que Bayern de Munique alimentava as restantes equipas alemãs, ou como o Lyon alimentava as restantes equipas francesas nos seus anos áureos, ameaçam cair por terra, se os clubes abraçarem, em definitivo, uma ideia de procura transnacional de talento a partir de muito tenra idade (Spoiler Alert: isto já é o presente!).
O Paris SG, este verão, gastou ainda 25 milhões na compra de Kurzawa ao AS Monaco, e mais 10 milhões na aquisição de Serge Aurier ao Toulouse. Só acreditando que isto poderá continuar a acontecer é que o PSG é positivo para o futebol francês, mesmo que o interesse no bom futebol que é praticado pelas restantes equipas se mantenha ligado com uma luta pelo segundo lugar, o novo tipo de “campeão” a que a maioria das equipas ainda podem aceder.