Sim, é verdade que a temporada 2014/15 foi totalmente dominada pelo Paris SG, que levou Liga, Taça da Liga e Taça de França. Mas também é verdade que no Hexágono aconteceram várias outras coisas de relevo, que merecem nota e valem mais atenção para uma competição que, muitas vezes, fica esquecida nas entrelinhas do futebol mundial. Mesmo que o dinheiro continue a fazer do Paris SG um vencedor mais ou menos programado para o futuro.
1.
O Paris SG acabou por levar tudo, ainda que, no campeonato, várias equipas tenham demonstrado capacidade para atrapalhar, no mínimo, a vida dos milionários da capital francesa. Laurent Blanc tem os melhores jogadores e, sobretudo depois de eliminado da Liga dos Campeões, teve todo o tempo do mundo para se preparar para atacar a reta final da Liga. Verdade seja dita que, apesar de não ter estado sempre em primeiro, soube manter-se a uma distância mínima do Lyon, adversário que até perto do fim esteve na luta pelo título. Mas com Ibrahimovic, Cavani, Lavezzi, Pastore, Verratti, Thiago Silva e Sirigu, apenas para citar alguns nomes, seria impossível não ser o vencedor de todas as provas em França. Qualquer coisa de menos, será sempre um falhanço na análise que se faça a uma equipa com este poderio.
2.
O Lyon muito deverá ao técnico Hubert Fournier, pela forma como conseguiu encarar esta temporada com um plantel muito jovem e despojado de grandes referências que abandonaram a equipa no último verão. Alexandre Lacazette, melhor marcador da Ligue 1, é um dos jogadores que esteve envolvido neste passo em frente de uma academia que continua a criar grandes jogadores como nenhuma outra. Outros nomes farão parte das futuras referências da modalidade. Fekir, Tolisso ou o internacional português Anthony Lopes fazem parte da base que tornou o futebol do Lyon irresistível. Ainda assim, não é certo que a equipa consiga manter todos os seus melhores jogadores. A evolução comercial não tem permitido ao Lyon ser tão sólido no mercado, ainda que o regresso à Liga dos Campeões seja mais um factor a ter em conta. Este ano, foram a equipa que fez frente ao PSG até ao fim. Para o ano, logo se verá.
3.
Leonardo Jardim não se mudou para o Monaco para aquilo que acabou por ter que fazer no Principado – levantar do chão uma instituição que mudou, do dia para a noite, de ser uma equipa de estrelas para ser uma equipa de jovens. As primeiras semanas da Ligue 1 foram muito complicadas e acabaram mesmo por ser decisivas no facto dos monegascos terem apenas terminado em terceiro lugar, já que os pontos perdidos poderiam ter permitido dar uma outra luta aos seus rivais. Bernardo Silva foi uma das grandes revelações deste Monaco em versão jovem, enquanto João Moutinho e Ricardo Carvalho estiveram também em excelente plano numa equipa que surpreendeu ao atingir os quartos-de-final da Liga dos Campeões. Leonardo Jardim soube adaptar-se ao contexto na perfeição e chega ao fim da época como um dos grandes vencedores. Para o ano, a exigência voltará a ser alta.
4.
Alguns rumores apontam para a possibilidade de Marcelo Bielsa não ficar mais de um ano no Marseille, mas que ano foi este o do técnico argentino na Liga Francesa. Chegou como chega sempre – com enorme impacto na forma como lida com os jogadores e com a comunicação social -, transformou o futebol do Marseille, tornou-a num conjunto atraente e ofensivamente muito cuidado, venceu jogos de forma inequívoca, foi líder, caiu na tabela, foi goleado em casa, foi criticado, agora é acarinhado e pedem-lhe para que fique. Fez também com que muitos adeptos do Marseille dissessem que preferem ser quartos classificados a jogar como o fazem com Bielsa do que mudar de treinador e terminar um pouco acima. Bielsa é uma revolução dentro da revolução. Uma personagem única. E nós continuaremos sempre a segui-lo, para onde quer que ele vá.
5.
É uma pena que as equipas francesas raramente vejam na Europa algum tipo de atração para se dedicarem a conseguir melhores resultados, sobretudo quando falamos da Liga Europa. Porque a verdade é que o meio da tabela da Ligue 1 está preenchido por grandes projetos. O Saint-Étienne joga um futebol atraente e tecnicista. Bordeaux e Montpellier, tal como o Lille, são equipas muito competentes e que criam sempre enormes problemas aos mais fortes da competição. Outros projetos, como o Guingamp, o Nice, o Bastia ou o Caen, para não esquecer o histórico Nantes, são capazes de grandes exibições, apesar de não tão regulares. Em termos de qualidade tática, o meio da tabela francesa não perde na comparação com nenhuma outra das cinco grandes. Não tanto pela capacidade de investimento, mas pela capacidade de detetar e fazer evoluir talento. França continua a ser um viveiro de referências de bom futebol. Não nos esqueçamos disso.
6.
Num ano em que o AJ Auxerre volta a entrar na conversa do futebol francês por ter atingido a final da Taça de França, o que é aliás apanágio da competição, dar esse tipo de possibilidades da equipas da Ligue 2, há nomes históricos que voltam a cair nas divisões secundárias. Lens e Metz não aguentaram entre os maiores, tal como o Évian, que ao carecer de apoio e estrutura não pôde continuar a competir com conjuntos mais fortes. Chegam de volta o Troyes e o Angers, depois de ausências mais ou menos longas, estreia-se o Gazélec Ajaccio, outra equipa da Córsega que consegue, de forma extraordinária, subir dos campeonatos amadores até à Ligue 1 num curto período de tempo. Mais uma razão para seguir de perto a aventura que é, ano após ano, o campeonato gaulês.