Ao fim de vinte e oito anos de abstinência, a Inglaterra marca presença numa meia-final do Campeonato do Mundo. Com inteira justiça, um dos maiores heróis desta cavalgada é Jordan Pickford, o guarda-redes de vinte e quatro anos que nos momentos mais exigentes e decisivos, voou para manter a seleção em prova. Courtois referiu-se à sua baixa estatura mas bocas dessas não penetram na carapaça do inglês com os pés bem assentes no chão. Depois do calo que ganhou nas divisões secundárias, ainda miúdo, há poucas coisas que possam abalar a confiança de Pickford. Um rapaz normal, que é também adepto.
Aço inglês forjado nas ligas secundárias
Quando Gareth Southagate escolheu Jordan Pickford para titular da baliza inglesa, acabando com a estafada discussão de resgatar ou não Joe Hart, foram mais que muitas as reservas. De facto, à parte o selecionador, que já tinha trabalhado com o jovem guarda-redes nos sub-21, pois viam essa aposta como ganhadora. Aliás, muitos foram os que alçaram as sobrancelhas quando o Everton se dispôs a pagar os trinta milhões de libras que o Sunderland exigia pelo seu passe. Era muito dinheiro por um quase desconhecido, com cara de miúdo.
A época de 2017/18 foi apenas a segunda de Pickford ao mais alto nível. No ano em que assumiu a baliza dos Black Cats, a equipa de Sunderland foi despromovida, o que não é propriamente medalha que se queira exibir. Na temporada passada foi aposta de Ronald Koeman mas o clube passou por momentos complicados. No meio dessas dificuldades, o guarda-redes crescia em ambiente competitivo.
Quando Thibaut Courtois fez aquele comentário sobre a baixa estatura do colega inglês – que mede apenas um metro e oitenta e cinco centímetros – Jordan Pickford desvalorizou com um encolher de ombros. Ele já ouviu bem pior, não tem complexos de inferioridade e o tamanho chega-lhe bem para fazer o seu papel. Num momento de lucidez e maturidade, lembrou os insultos e abuso que apanhou quando penava pelas ligas semiprofissionais inglesas, ainda adolescente. Isso é que era dureza. O Campeonato do Mundo é para meninos!
Subir a pulso
Ao contrário de outras gerações anteriores, sustentadas por virtuosos que desde tenra idade foram tratados como prodígios – Paul Gascoigne, Gary Lineker, David Beckham, Steve Gerard, Wayne Rooney – esta tem como pilares rapazes normais. Não só não há uma estrela da companhia que resolva como o percurso daqueles que aparecem em destaque é completamente diferente. Harry Kane era o gordinho, desengonçado, em quem poucos depositaram qualquer futuro. Jordan Pickford não tinha o físico que se deseja para um guarda-redes de alta competição no futebol moderno. Um e outro perseveraram mesmo quando foram emprestados e desvalorizados. Resulta um carácter bem diferente, um que está menos dependente da validação externa. São obreiros que conquistaram o lugar a pulso, sabem como os louvores são passageiros.
Durante anos, o jovem Pickford andou a jogar pelos campos do futebol semiprofissional – Darlington, Burton, Carlisle, Bradford, até chegar ao Preston, no Championship – com os adeptos adversários quantas vezes colados, literalmente, às costas. Foi determinante na eliminação da Colômbia, nos oitavos, nas grandes penalidades. E nos quartos, frente à Suécia, voltou a fazer três grandes defesas, em momentos decisivos, que podiam ter alterado o sentido do encontro. Eleito homem do jogo nesse dia, saiu a trautear “we’re going all the way”. Afinal, ele é um rapaz normal, que é também adepto da seleção do seu país.
Boas Apostas!