Ontem à noite Pep Guardiola fez o último jogo europeu com o Bayern de Munique, ao ser afastado na meia-final da Liga dos Campeões pelo Atlético de Madrid. A discussão, que já era anterior à partida, explodiu: o que vale a passagem pelo clube bávaro sem vencer a Liga Milionária? Idolatrado por muitos como um génio que revolucionou o futebol não falta quem procure descobrir-lhe pés de barro. Para ele, que é um pensador, este julgamento não será uma surpresa. Por mais alto que se suba, o sucesso é sempre relativo. Mas os seus jogadores lamentaram não lhe poder oferecer a qualificação para a final como presente de despedida. E essa é a maior validação do trabalho de um treinador.

Começar pelo fim

Pep_GuardiolaPep Guardiola ganhou tudo com o Barcelona. Fê-lo elevando o futebol total do clube catalão a um outro patamar de intrincada sofisticação. O mundo inteiro rendido ao tiki-taka e ao génio que tinha vindo redesenhar o futebol ofensivo. Hoje já se ouvem algumas vozes dissonantes dizer que esse estilo de futebol dá sono e aborrece mas no auge era só Mourinho a dar a cara e nele isso soava ressabiado. O catalão tinha uma ideia muito clara de como uma equipa de futebol devia jogar e no seu clube do coração teve a oportunidade de concretizar esse ideal. Mas ao ganhar tudo, com mão de ferro e sem embarcar em cedências Guardiola começou a incomodar no clube Culé. O seu nome tinha demasiado peso.

No fundo, Guardiola começou pelo fim. Depois de um ano a treinar a equipa B assumiu o seu lugar de sonho. Teve à mão os melhores jogadores do mundo, com a ambição coletiva de serem “mais que um clube”. A partir daí qualquer outra experiência só pode ficar aquém.

Tudo ou nada

Guardiola foi contratado pelo Bayern de Munique para devolver o estatuto de potência europeia ao clube alemão. O grande azar de Pep foi herdar uma equipa que acabava de ganhar a Liga dos Campeões. Jupp Heynckes aceitou graciosamente a reforma, ainda que estivesse a ser convidado a sair, mas na última temporada venceu tudo. A hegemonia dos Bávaros nas provas domésticas era e continua a ser incontestável. Mas a direção do Bayern queria que o clube voltasse a ser um candidato crónico à Liga Milionária. Com Guardiola o clube alcançou por três vezes consecutivas a meia-final da prova de elite europeia mas nunca chegou sequer à final, muito menos ao título. Como uma espécie de karma Real Madrid, Barcelona e, agora, Atlético de Madrid que fosse mais longe.

Ao fim de três anos em Munique o catalão sai sem o troféu mais ambicionado. Venceu uma Taça da Alemanha e, a não ser que aconteça um cataclismo, três vezes a Bundesliga. Quer isso dizer que Guardiola fracassou no Bayern? A resposta imediata é sim, já que era essa a expetativa que esteve na génese da sua contratação. Herdou um campeão europeu que não voltou a sê-lo, sob o seu comando. Mas essa falha, na minha opinião, não devia pôr em causa a sua reputação. Põe é em evidência um erro de casting. Quem o contratou queria uma revolução no clube bávaro. Só podia, já que o único currículo que Guardiola tinha era de quem chega e redefine tudo de acordo com as suas ideias. Uma transformação destas não se faz sem tempo e sem algumas dores de crescimento. Aparentemente, quem o contratou também queria continuidade e resultados imediatos. Isso pode ser Ancelotti mas nunca seria Pep Guardiola.

Tudo é relativo

Pep_Guardiola_braçosAo longo de nove anos de carreira, um dos quais na filial do Barça, o treinador Pep Guardiola conquistou dezoito títulos entre as provas mais exigentes que há no mundo do desporto rei: três Ligas Espanholas, duas Taças do Rei, uma Supercopa espanhola, três Campeonatos do Mundo de Clues, duas Ligas dos Campeões, três Supertaças Europeias, uma taça da Alemanha e três (assumo o risco calculado) Bundesligas. Ver nisto algum vislumbre de falhanço é um absurdo. A não ser que se considere razoável exigir a invencibilidade. E a contribuição do catalão para o futebol está longe de se cingir ao palmarés. Arrisco até a dizer que será o de menos.

Há sempre margem para melhorar e de certeza que Guardiola leva desta sua experiência germânica muito para digerir. Por tudo o que se conhece do seu modo de estar ele será, certamente, o seu maior crítico. No Manchester City terá um desafio à sua altura e irá, sem dúvida, ter sucesso. Que será sempre relativo.

Boas Apostas!